quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Como um ballet do coração



O imaginário da América nunca exerceu grande poder sobre mim. Mas ontem, numa cadeira do S. Jorge, pensei como seria extraordinário poder visitar a América. Este foi, para mim, um dos ganhos de Apocalypse, a Bill Callahan Tour Film. A América é justamente o coração do filme. O espectador vê sequências da vastidão, do quotidiano, da diferença, intervaladas por actuações de Callahan. Algumas destas são justapostas, o que parece sublinhar a ideia do andar, do caminho que é feito. Apocalypse não se centra no lado privado de Callahan. Se o espectador está interessado nesses pormenores, o filme não o serve. Pouco se sabe sobre ele e, pelo menos para mim, isso não é relevante. A certa altura diz qualquer coisa como: "quando estou em palco estou no expoente da minha realidade". Pode soar a cliché, mas Callahan aparenta ser um homem que sabe usar as palavras certas. E as actuações são extraordinárias, de uma beleza firme e simples. Uma imagem que pode condensar esta beleza é a sequência onde se lança fogo de artifício no quintal de uma casa, como quem mostra que é possível transformar o quotidiano, o óbvio, em algo poético. Parece fácil e eficaz. Dito isto, Apocalypse não é um registo extraordinário, mas tem uma ideia - forma-se em constante acção, crescendo a partir das palavras do cantor sobre o movimento. Tem um momento menos feliz, aquando da actuação da maravilhosa Riding for the Feeling, que gera um pequeno esgar de troça. De resto, sai-se satisfeito da sala de cinema. 

K. Douglas