segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

A colecção de discos: um género de biografia




O último disco que comprei foi o Tigermilk dos Belle and Sebastian. Encontrei-o a 10 euros numa loja de discos em segunda mão. Como é mais ou menos regular (ou pelo menos já foi mais assim), esta loja encontra-se num centro comercial pequeno, cujo dourado nas paredes ainda reluz os anos oitenta. Assim, às vezes, quando estou na esplanada interior, os penteados e as roupas parecem recusar a forma actual. Há uma leve melancolia nas montras das lojas que anunciam promoções de roupa interior ou, então, na montra da loja de informática que acumula gadgets já pouco ou nada funcionais. A loja de discos tem uns quantos vinis colados na montra. São clássicos a dar para o óbvio: Beatles, Amália, um ou outro hit dos anos oitenta (pelos menos não há Bonnie Tyler, julgo), etc. Nada causa surpresa, um leve pulo. E a acontecer, logo seria refreado, pois o que está na montra não é para venda - só os discos no interior. Olhamos para eles e sabemos que não vale a pena o trabalho de os ver. O mau génio do dono da loja não se atreve a censurar o nosso desdém. No entanto, pode encontrar-se sempre alguma coisa que na altura não se comprou e que nunca se encontrou a um bom preço.

A minha colecção de discos é pequena. Há uns tempos atrás reparei que me faltam cerca de 20 discos para atingir um número redondo. Decidi então ir comprando os discos de que gosto muito, mas que não tenho. Não é uma regra rígida. Este fim-de-semana decidi dar uma nova arrumação aos discos e tentei uma arrumação por afinidades. Ao mesmo tempo, separei aqueles que me lembro ter comprado na dita loja. Não são maus discos, embora um ou outro tenha sido comprado porque que queria gastar dinheiro. Exemplo: o disco de covers de Joni Mitchell, editado em 2000. Apesar da soberba cover de si própria - Both Sides Now (uma canção de amor perfeita?) -, o disco não se livra da aura de canções para uma mulher solteira de 30 anos. Por outro lado, vi com nitidez que o primeiro disco que ali comprei foi o Dog Man Star. O sítio dos discos na vida não é apenas um só: desaparecem num sítio para aparecerem noutro. É  o caso de Tigermilk.. Dizer que a música pop está apegada à vida não é um mero cliché. A estante dos discos é um sinal inequívoco disso - remete sempre para algo diferente de si. Por isso é que às vezes se baralha tudo, pondo os discos ao calhas, ou então se arruma por ordem alfabética, o modo mais impessoal, objectivo, de todos.


K. Douglas