Certa vez apanhei um táxi. O condutor estava a ouvir a Renascença (introduzir expressões a gosto de leitor) e António Sala (introduzir novas expressões) entrevistava José Rodrigues dos Santos sobre o seu último romance, Sétimo Selo. O momento derradeiro da entrevista foi quando Sala quis provar de forma inequívoca a existência de Deus, coisa que me escuso de reproduzir, pois foi ridículo, obtuso e adjectivos que o leitor, também aqui, pode introduzir. Isto é um post interactivo. Justamente, mais ou menos ao mesmo tempo, a Bertrand comemorava o seu aniversário e oferecia um jantar com o escritor preferido dos leitores. Neste caso, José Rodrigues dos Santos. Coisa curiosa, muito curiosa. A primeira impressão é: não há mais escritores? A segunda: as funcionárias da administração pública devem andar loucas, em ebulição. Só estariam mais loucas se a Difel lhes desse um jantar com Isabel Allende. Terceira: o sacrifício de José Rodrigues dos Santos, esquecido imediatamente pelo dinheiro posto ao bolso. Sabe-se lá quem vai aparecer à frente do senhor. Bem, fiquemos com uma funcionária pública. Vai chegar à repartição com o cabelo arranjado e vai repetir que quando sair vai andar numa roda viva para escolher o que vai vestir. Agora surge uma outra pergunta: qual o restaurante? Agradável, mais ou menos selecto? É capaz. O pivot vai recebê-la com a cortesia que o protocolo exige. Vão escolher o vinho e ela vai dizer, tímida, que é um prazer estar ali e que leu todos os seus romances desde a Filha do capitão. Imediatamente a seguir, já com alguma confiança ganha: "Ai, aquele Almerindo desalmado! Estas coisas ainda acontecem em Portugal, que horror! O Miguel Sousa Tavares, também gosto muito dele, tinha toda a razão: em Portugal não se gosta de ser livre." O outro assente. Poderia problematizar a coisa, mas não lhe apetece. Pergunta por coisas que ela gosta de ler e a resposta é rápida: "Detesto o Saramago, aquele homem não usa vírgulas. Gosto de poesia e de algum teatro... e gosto muito de si e daquela cena de sexo do Codex. Dito isto e sabendo que JRS confidenciou ao público, há alguns anos atrás, que conseguia abanar as orelhas, será que ela lhe vai pedir semelhante coisa? Será que amanhã, a Madalena, da secretária ao lado, vai ficar estarrecida quando a outra lhe disser: "Ele abanou a orelha só para mim." Mas a pergunta derradeira é: quer mesmo ir jantar com José Rodrigues dos Santos?
K. Douglas