I've looked at life from both sides now
From win and lose and still somehow
It's life's illusions I recall
I really don't know life at all
I've looked at life from both sides now
From up and down, and still somehow
It's life's illusions I recall
I really don't know life at all
From win and lose and still somehow
It's life's illusions I recall
I really don't know life at all
I've looked at life from both sides now
From up and down, and still somehow
It's life's illusions I recall
I really don't know life at all
Joni Mitchell, Both Sides Now
A sexta temporada de Mad Men foi talvez a ocasião em que vivi de forma mais intensa o acompanhamento de uma série de televisão. Isto deve-se a várias razões, entre as quais destaco o facto de esta ter sido das primeiras vezes em que segui uma série no momento em que está a ser emitida. Por outro lado, e mais importante do que o modo de acompanhamento, está o que a temporada oferece ao espectador. A início pode parecer dispersa, uma vez que a acção se dilata em várias frentes: Don, Peggy, Pete, Joan. Isto não significa que a série tenha uma falsa partida, pelo contrário. Por exemplo, a história de Betty na village, em busca da amiga de Sally, não deixa de dizer coisas sobre a sua vida, nomeadamente de como acha que poderia ter sido mais do que uma doméstica suburbana e ter construído a sua própria carreira. Também Joan não está bem com aquilo que tem. Fez um sacrifício grande, continua a ser tratada como uma secretária e Don, a uma certa altura, manda por água abaixo a possibilidade de ela recolher os frutos do seu sacrifício. Já Peggy parece estar bem no início da temporada. Completamente trabalhadora, competente, talentosa e insuportável, as coisas correm-lhe bem. O que não significa que não faça porcaria como trair a confiança de Stan na campanha da Heinz. E claro, Don. Mas Don fica para último. O que eu queria dizer há pouco é que a temporada fica mais coesa e excitante a partir do sexto episódio - For Immediate Release.
É neste episódio que se responde a uma das perguntas do final da quinta temporada. A primeira pergunta - se Don está sozinho - tem a resposta logo no episódio de estreia da temporada. Sim, está sozinho. O momento de felicidade e fidelidade com Megan acabou. Ficamos a saber que tem um caso com a vizinha de baixo, Sylvia. Mas a outra pergunta que se punha era: como vai ser a relação de Don e de Peggy? Como sempre, Mad Men não é previsível. Imaginava eu que se encontrariam num clima de competição e que cada um teria as suas vitórias e algum confronto. É isso que acontece na campanha da Heinz, da qual Peggy sabe de forma indevida. Claro que o encontro dos dois é tenso e o facto de Don ficar atrás da porta a escutar o que a sua antiga protegida está a dizer não deixa de mostrar de como Peggy o afecta. O que acontece, porém, é uma reviravolta. Em For Immediate Release, Peggy volta à Sterling Cooper, o que não a deixa muito satisfeita. O regresso de Peggy é cómico e amargo. Tal como a Maria notou, é conduzida novamente por Joan ao seu novo gabinete. E que gabinete é este? O gabinete que tem uma coluna a meio, que Pete tanto odiava. Este aspecto não deixa de fazer lembrar a fotocopiadora que Joan enfiou no gabinete de Peggy no início da segunda temporada.
Ou seja, a relação de Don e de Peggy estabelece-se no mesmo espaço, mas com novas variáveis. Nomeadamente: Ted. O novo patrão de Peggy é diferente de Don e Peggy sublinha isso constantemente. Peggy precisa de reconhecimento, Ted dá-lhe isso de modo imediato. Don não. Podemos lembrar-nos daquele que é para mim um dos episódios mais marcantes de toda a série - The Suitcase (quarta temporada) - em que Peggy grita com Don: "Mas tu nunca dizes obrigado!" "É para isso que serve o dinheiro!", responde ele. Já a cumplicidade entre Ted e Peggy é evidente, o que desagrada a Don e leva-o a procurar agitar isso, confrontando-a. e, em último caso, humilha-a ,e a Ted também, aquando da apresentação do anúncio que criaram inspirado em Rosemary's Baby. A verdade é que a vida de Peggy até certo ponto se joga na atenção destes dois homens. Mas, num momento magnífico, em que está entre o gabinete de um e de outro, olha para ambas as portas, que se fecham e percebe que nenhum deles estará lá para ela. Sozinha, acabará no gabinete de Don - "onde tudo acontece" - e onde começará a construir a sua vida. Será que a sétima temporada trará uma Peggy verdadeiramente independente (e quiçá mais insuportável para quem trabalha para ela)?
A relação Peggy-Joan é uma das minhas favoritas da série. E ambas têm um momento de verdade, em que se confrontam. As acusações são justas, especialmente as de Peggy. Vejamos, Joan sempre menorizou Peggy e não perdeu uma única oportunidade para a por no sítio que achava que era o dela. Já Peggy responde a Joan que ela nunca dormiu com Don e aquilo que conseguiu foi fruto do trabalho dela. Joan ressente-se porque sabe que, desde a campanha da Jaguar, ouvirá sempre este comentário. Ao mesmo tempo, Peggy mostra como apesar de tudo ouviu o que Joan lhe disse, chegando a dizer que nunca lhe tinha passado pela cabeça a situação em que ela diria: Joan, fizeste mal. O que também é interessante nestas duas é que elas jogam o que está instituído para conseguirem o que querem. Joan sabe que "isto não é a China, não há dinheiro na virgindade" e Peggy, a certas alturas, esforçou-se para ter a atitude de homem para conseguir singrar. Mas na situação concreta da Avon, é Joan que parece ter o golpe de asa de independência e não Peggy que acha que o negócio está perdido por Pete não estar presente. Neste episódio, o calibre de Pete mostra-se em todo o seu esplendor ao confrontar Joan, depois de ter descoberto que ela o tinha afastado do encontro.
Ninguém gosta de Pete Campbell. Não é para menos, ele é odioso. No final da quinta temporada, sovado, consegue aquilo que queria: um apartamento na city. E aí que o encontramos, sozinho, com uma amante ou outra. Mas Pete decidiu envolver-se com a vizinha e Trudy deixa as coisas bem claras, terminando com uma ameaça : I will destroy you. Foi bom ver Trudy a tomar esta atitude e a personagem revelou-se bem mais complexa. Pete continua a suicidar-se a todo o momento. E mesmo quando tem toda a razão do mundo para confrontar Don, cai das escadas abaixo. É ultrapassado por Joan na Avon e tem que lidar com uma mãe demente que lhe diz a certa altura que ele sempre foi "unlovable". Mas há duas pessoas que gostam de Pete. A primeira é Peggy, que parece não lhe guardar ressentimento, apesar de ele a ter tratado bastante mal. A segunda é o mistério da temporada: Bob Benson. Claro que aquelas palavras e aquele toque de joelho são memoráveis. É certo que Pete parece aprender com os erros, mas a relação que poderá ter com Bob pode ter contornos nefastos para si. Até agora é Bob que está no controlo da situação. Quando Pete é convidado para experimentar o Chevy, no último episódio da temporada, o espectador exclama de imediato: mas tu não sabes conduzir! Os resultados não se fazem esperar.
Bob até então não tinha mostrado esta faceta. Até então era um tipo demasiado simpático, solícito, e espalhava bem-estar à sua volta. Tem o particular dom de controlar as situações e esse aspecto ficou muito claro com o poder que exerce sobre Pete. Este estava fora de si por causa do enfermeiro da mãe - Manolo - e Bob exige que ele se acalme e se sente. Coisas que Pete faz de imediato. O espectador não deixa de ficar surpreendido com Pete que teve sempre uma atitude de sobranceria para com os subalternos. Por outro lado, até que ponto Bob soube interpretar Pete para lhe dizer o que lhe disse e lhe tocar com o joelho? Foi um passo em falso no plano que tem para se construir a si mesmo? É certo que ele mente e tem alguém atrás de si - "Pete Campbell és un hijo de puta", grita a alguém ao telefone, quando aquele o procura afastar. Estará Bob desgostoso com Pete e, ao mesmo tempo, receoso de que ele pode ameaçar a sua agenda? O próprio desaparecimento da mãe de Pete não deixa de ser suspeito. E a sua relação com Joan e o desafio a Roger? E Roger deve ficar mesmo chateado porque sempre que o encontra em casa de Joan, Bob veste shorts ou um avental. Coisa que Don Draper nunca faria.
Outro grande momento da série foi na segunda temporada, quando Peggy lembra o que lhe aconteceu. No hospital, recebe a visita de Draper que lhe diz para ela seguir em frente e mais concretamente lhe diz qualquer coisa como isto: vais ficar chocada ao perceber que isto nunca aconteceu. Esta é uma das chaves para Don. Levou a vida toda a procurar outra coisa, a querer recomeçar, a querer ter paz. Gostei muito quando Sylvia lhe diz que espera que ele encontre paz. Don não mente apenas aos outros, mas mente também a si próprio, como se para curar uma dor, usasse uma outra dor mais suportável. Mas há coisas que nós não podemos anestesiar e fingir que nunca aconteceram. Por outro lado, consegue ser profundamente egoísta e isso nota-se quando ajuda o filho de Sylvia. As suas intenções não são as mais genuínas e Sally não deixa de ficar afectada com isso. Don é uma espécie de morto-vivo; não tem uma naturalidade consigo mesmo. Logo no início da temporada, o fotógrafo pede-lhe para ele posar como ele é realmente, coisa que o deixa desconcertado. O anúncio do Hawai (de que gostei muito), como a Maria escreveu, tem o sentido de Don despir as suas roupas e chegar a um lugar que é o seu e que passa por uma figura maternal. Toda a admiração que Ted tem por Don, como director criativo, é que este procura criar situações de bem-estar das pessoas consigo mesmas. Don é exímio a recriar pequenos-almoços perfeitos, a mãe que que se queima levemente na forma da tarte, mas que está feliz. O cheiro do bolo, a luz a entrar pelas vidraças da cozinha, a luta pela primeira fatia, etc. A mãe e a felicidade que ele nunca teve. É por isto que, como a Maria escreveu, a sua honestidade brutal (Don estava num ponto sem retorno) para com os homens da Hershey's foi um dos momentos mais emotivos de toda a série. Jon Hamm foi, uma vez mais, brilhante. Ou então, foi um bocado mais brilhante do que o costume.
Claro que a sua honestidade têm um preço e os "amigos", sócios, afastam-no (Joan, bitchy again). Mas Don começou aquele que parece ser o caminho de paz e o fecho da temporada tem um grande poder e beleza. Don, Dick, mostra aos filhos o sítio onde cresceu. Sally fica a saber alguma coisa do pai. O que vai acontecer na sétima temporada é uma incógnita para mim. Este é um dos toques de ouro de Mad Men, para além de todo o imenso talento com que é escrito e interpretado. Consegue ser assombroso (alguém se lembra de Draper sentado numa cadeira de dentista a pedir ao irmão morto que não o abandone, depois de ele lhe ter virado as costas?). É também por isto que acho que Mad Men é de uma beleza firme, segura, que me faz colocar esta série à frente de outras de que gosto tanto. Uma nota final: a escolha de Both Sides Now. Conheço a versão de Joni Mitchell já há alguns anos e sempre achei que era uma canção extraordinária. Mas há coisas que não se percebem bem aos vinte anos de idade. Talvez diga isto aos quarenta. Não sei. No entanto, é uma daquelas canções que não tem e não pode ter tempo.
A relação Peggy-Joan é uma das minhas favoritas da série. E ambas têm um momento de verdade, em que se confrontam. As acusações são justas, especialmente as de Peggy. Vejamos, Joan sempre menorizou Peggy e não perdeu uma única oportunidade para a por no sítio que achava que era o dela. Já Peggy responde a Joan que ela nunca dormiu com Don e aquilo que conseguiu foi fruto do trabalho dela. Joan ressente-se porque sabe que, desde a campanha da Jaguar, ouvirá sempre este comentário. Ao mesmo tempo, Peggy mostra como apesar de tudo ouviu o que Joan lhe disse, chegando a dizer que nunca lhe tinha passado pela cabeça a situação em que ela diria: Joan, fizeste mal. O que também é interessante nestas duas é que elas jogam o que está instituído para conseguirem o que querem. Joan sabe que "isto não é a China, não há dinheiro na virgindade" e Peggy, a certas alturas, esforçou-se para ter a atitude de homem para conseguir singrar. Mas na situação concreta da Avon, é Joan que parece ter o golpe de asa de independência e não Peggy que acha que o negócio está perdido por Pete não estar presente. Neste episódio, o calibre de Pete mostra-se em todo o seu esplendor ao confrontar Joan, depois de ter descoberto que ela o tinha afastado do encontro.
Ninguém gosta de Pete Campbell. Não é para menos, ele é odioso. No final da quinta temporada, sovado, consegue aquilo que queria: um apartamento na city. E aí que o encontramos, sozinho, com uma amante ou outra. Mas Pete decidiu envolver-se com a vizinha e Trudy deixa as coisas bem claras, terminando com uma ameaça : I will destroy you. Foi bom ver Trudy a tomar esta atitude e a personagem revelou-se bem mais complexa. Pete continua a suicidar-se a todo o momento. E mesmo quando tem toda a razão do mundo para confrontar Don, cai das escadas abaixo. É ultrapassado por Joan na Avon e tem que lidar com uma mãe demente que lhe diz a certa altura que ele sempre foi "unlovable". Mas há duas pessoas que gostam de Pete. A primeira é Peggy, que parece não lhe guardar ressentimento, apesar de ele a ter tratado bastante mal. A segunda é o mistério da temporada: Bob Benson. Claro que aquelas palavras e aquele toque de joelho são memoráveis. É certo que Pete parece aprender com os erros, mas a relação que poderá ter com Bob pode ter contornos nefastos para si. Até agora é Bob que está no controlo da situação. Quando Pete é convidado para experimentar o Chevy, no último episódio da temporada, o espectador exclama de imediato: mas tu não sabes conduzir! Os resultados não se fazem esperar.
Bob até então não tinha mostrado esta faceta. Até então era um tipo demasiado simpático, solícito, e espalhava bem-estar à sua volta. Tem o particular dom de controlar as situações e esse aspecto ficou muito claro com o poder que exerce sobre Pete. Este estava fora de si por causa do enfermeiro da mãe - Manolo - e Bob exige que ele se acalme e se sente. Coisas que Pete faz de imediato. O espectador não deixa de ficar surpreendido com Pete que teve sempre uma atitude de sobranceria para com os subalternos. Por outro lado, até que ponto Bob soube interpretar Pete para lhe dizer o que lhe disse e lhe tocar com o joelho? Foi um passo em falso no plano que tem para se construir a si mesmo? É certo que ele mente e tem alguém atrás de si - "Pete Campbell és un hijo de puta", grita a alguém ao telefone, quando aquele o procura afastar. Estará Bob desgostoso com Pete e, ao mesmo tempo, receoso de que ele pode ameaçar a sua agenda? O próprio desaparecimento da mãe de Pete não deixa de ser suspeito. E a sua relação com Joan e o desafio a Roger? E Roger deve ficar mesmo chateado porque sempre que o encontra em casa de Joan, Bob veste shorts ou um avental. Coisa que Don Draper nunca faria.
Outro grande momento da série foi na segunda temporada, quando Peggy lembra o que lhe aconteceu. No hospital, recebe a visita de Draper que lhe diz para ela seguir em frente e mais concretamente lhe diz qualquer coisa como isto: vais ficar chocada ao perceber que isto nunca aconteceu. Esta é uma das chaves para Don. Levou a vida toda a procurar outra coisa, a querer recomeçar, a querer ter paz. Gostei muito quando Sylvia lhe diz que espera que ele encontre paz. Don não mente apenas aos outros, mas mente também a si próprio, como se para curar uma dor, usasse uma outra dor mais suportável. Mas há coisas que nós não podemos anestesiar e fingir que nunca aconteceram. Por outro lado, consegue ser profundamente egoísta e isso nota-se quando ajuda o filho de Sylvia. As suas intenções não são as mais genuínas e Sally não deixa de ficar afectada com isso. Don é uma espécie de morto-vivo; não tem uma naturalidade consigo mesmo. Logo no início da temporada, o fotógrafo pede-lhe para ele posar como ele é realmente, coisa que o deixa desconcertado. O anúncio do Hawai (de que gostei muito), como a Maria escreveu, tem o sentido de Don despir as suas roupas e chegar a um lugar que é o seu e que passa por uma figura maternal. Toda a admiração que Ted tem por Don, como director criativo, é que este procura criar situações de bem-estar das pessoas consigo mesmas. Don é exímio a recriar pequenos-almoços perfeitos, a mãe que que se queima levemente na forma da tarte, mas que está feliz. O cheiro do bolo, a luz a entrar pelas vidraças da cozinha, a luta pela primeira fatia, etc. A mãe e a felicidade que ele nunca teve. É por isto que, como a Maria escreveu, a sua honestidade brutal (Don estava num ponto sem retorno) para com os homens da Hershey's foi um dos momentos mais emotivos de toda a série. Jon Hamm foi, uma vez mais, brilhante. Ou então, foi um bocado mais brilhante do que o costume.
Claro que a sua honestidade têm um preço e os "amigos", sócios, afastam-no (Joan, bitchy again). Mas Don começou aquele que parece ser o caminho de paz e o fecho da temporada tem um grande poder e beleza. Don, Dick, mostra aos filhos o sítio onde cresceu. Sally fica a saber alguma coisa do pai. O que vai acontecer na sétima temporada é uma incógnita para mim. Este é um dos toques de ouro de Mad Men, para além de todo o imenso talento com que é escrito e interpretado. Consegue ser assombroso (alguém se lembra de Draper sentado numa cadeira de dentista a pedir ao irmão morto que não o abandone, depois de ele lhe ter virado as costas?). É também por isto que acho que Mad Men é de uma beleza firme, segura, que me faz colocar esta série à frente de outras de que gosto tanto. Uma nota final: a escolha de Both Sides Now. Conheço a versão de Joni Mitchell já há alguns anos e sempre achei que era uma canção extraordinária. Mas há coisas que não se percebem bem aos vinte anos de idade. Talvez diga isto aos quarenta. Não sei. No entanto, é uma daquelas canções que não tem e não pode ter tempo.
K. Douglas