sábado, 22 de dezembro de 2007

Serão

Também gosto da parafernália natalícia. Desdenho dos galos da autenticidade e a desejar alguma coisa, desejo justiça, no sentido mais amplo que a palavra possa comportar. Infelizmente, a palavra é pouco usada nos léxicos do quotidiano e, quando usada, parece ser sinónimo de castigo institucionalizado. Léxicos do quotidiano? Ou é Manuel Machadez ou... bem, não interessa. A propósito, os Gato Fedorento foram-se embora. Fizeram um manguito à Fame, Fame, Fatal fame, o que, diga-se, foi um acto anti-rock. Ou foram muito mais espertos e asseguraram a sua permanência, sem terem que fazer o quarto ou quinto disco, onde as bandas, em geral, começam a tropeçar. De todos os modos ou de nenhum, é pena. O serão de Domingo estava feito: a noite começava com pseudo-Maquiavel para suburbanos ou provincianos que acham que o pragmatismo é a forma de saber e ganhar as coisas boas da existência. Seguia-se o dito magazine.  Às vezes era parvo e tonto. É verdade, nem sempre tinha graça... A noite terminava com Conta-me como foi que, nos últimos episódios, anda a mostrar as elegantes pernas de Rita Brütt. Não sei se é assim que se escreve. Boas Festas!
K. Douglas.
P.S.- Luís Pedro Nunes tem ar de quê? Envie um mail com a sua resposta.

Winter Wonderland


Bing Crosby e Marjorie Reynolds em Holiday Inn

Gosto do kitsch natalício. Gosto das luzes, das lojas decoradas e do consumismo desenfreado que ignora o verdadeiro sentido da quadra, i.e., os presentes. Gosto do tédio do Natal em família. Gosto das canções. Certo ano, num destes últimos Natais, estava eu a preparar um trabalho e ia, carregada de livros, sentar-me nos cafés, onde era capaz de passar tardes inteiras, lendo e protegendo-me do frio com cappuccinos, ou chá, ou chocolate quente. Como pano de fundo, nessas escuras e curtas tardes, tinha as canções de Natal. A tarde toda. Pela primeira vez, apercebi-me do número infindável de canções que celebram esta quadra e o que poderia parecer um cenário infernal tornou-se numa interessante experiência. Uma após outra, eram todas diferentes. São, agora, indissociáveis desse delicioso Dezembro. São indissociáveis do ringue de patinagem no gelo da Somerset House, do carrossel de Covent Garden, das gulosas montras do Fortnum & Mason ou da nossa festa de Natal num apartamento da margem sul.
Sim, algumas destas canções são pirosas, mas não aceito que digam mal delas. Porque são nostálgicas e fazem parte do meu Natal perfeito.
Tenham um Natal feliz.

Maria Braun

sábado, 15 de dezembro de 2007

Él tema de nuestro tiempo - Sócrates y Gasset.

Parece que o nosso primeiro-ministro - Avé! - gosta de Ortega y Gasset. Perguntamo-nos o que extrairá o nosso encantador, charmoso, primeiro-ministro dos textos de Gasset. Por exemplo, ao ler Historia como sistema, nomeadamente aqueles parágrafos em que se diz que a partir da nossa circunstância devemos criar novos sistemas políticos, pois já fomos feudais, absolutos, liberais, etc. Será que Sócrates, convencido que, afinal, não é uma coisa, mas um existente e, por isso, uma história, uma forma de narrativa, pondera um sistema político para o futuro? Será que são estas ideias que estão implícitas nos seus discursos? Será que os clichés do movimento, do olhar para a frente, da construção, etc., etc., se fundamentam na leitura de Gasset? Ou será todo um projecto para as calendas gregas? Talvez Sócrates goste da limpidez, do entusiasmo, se assim se pode dizer, de Gasset na crítica que faz à ontologia tradicional. Porém, suspeitamos que Sócrates fique em frente ao seu grande e largo espelho e repita "Yo soy yo y mi circunstância." O que significa: "Soy muy rico y muy bello."Em último caso, esperemos que sim, pois não queremos que o nosso hermoso primeiro-ministro deixe de ser, precisamente, o tema do nosso tempo.
K. Douglas

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Um prémio merecido

Como foi noticiado, Norman Mailer ganhou, recentemente, com a sua última obra, The Castle in Forest, o prémio Bad Sex in Fiction Award, o qual premeia, todos os anos, a pior descrição literária de uma relação sexual. Considero injusto não se contemplar também o que por aqui se faz de melhor, ou de pior, como preferir. Afinal, neste assunto, não há nada como a língua de Camões. Senão, vejamos:
“E iniciava então, com apressada lentidão, esta verdadeira tocata e fuga de Bach dos Genitais que era a sua homenagem carinhosamente impetuosa ao membro viril de Tito, o qual saltava como um espadarte de prata apanhado por um anzol esperto e enérgico, os lábios de Sally. O ruivo anarconiilista bem tentara, numa dessas experiências inolvidáveis, cronometrar quanto tempo durava exactamente a cerimónia toda, desde o início até à apoteose líquida final, ao clímax gritado de olhos fechados, mas depressa constatara que o sublime, tanto na música como no sexo, não pode ser rigorosamente quantificado, pois logra condensar o eterno no instante, o imenso no detalhe e o infinito na mera molécula.”
In João Medina, Os Náufragos do Mar da Palha, Lisboa, Livros Horizonte, 2006, pp. 289-290.
Esta passagem, sim, é que é o sublime do reles! E tal não pode ser quantificado, não senhor! Repare no insólito das metáforas (Bach dos Genitais?!) e em toda a imagem perturbadora do espadarte, sobretudo para quem gosta de peixe. Qual Garganta Funda, qual quê?! O autor merecia um doutoramento honoris causa em ordinarice!
E com esta me fico. Boas leituras!Sally Bowles

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Imitação de Vida




Foi Woody Allen que disse, em Maridos e Mulheres, “life does not imitate art, it imitates bad television”. Na verdade, por vezes, a “má televisão” tem como modelo o bom cinema. A que propósito vem isto? A propósito dos filmes que Douglas Sirk, realizador alemão de origens dinamarquesas, concebeu nos seus anos em Hollywood, filmes que se enquadram num género melodramático, no qual se encontram as raízes das modernas telenovelas. No entanto, os filmes de Sirk atingem, por vezes, a perfeição absoluta. É o caso de Imitação de Vida (1959), o último dos filmes americanos de Sirk, em re-estreia em Portugal esta semana.
Descobri Sirk há alguns anos quando, naquela idade adolescente em que se toma aquilo que os nossos role models dizem como se fosse algo de indiscutível e sagrado, três dos meus realizadores de eleição citavam Sirk como influência determinante no seu próprio estilo. Falo de Fassbinder, Almodóvar e Todd Haynes. Tenho de lhes agradecer o fascínio da descoberta desses melodramas lacrimejantes, exagerados e muito, muito mais subtis e inteligentemente estruturados do que a crítica que lhes era contemporânea alguma vez percebeu.
Imitação de Vida é, aparentemente, uma história de mães e filhas, de conflitos geracionais moldados pelo tradicional “filme de mulheres” de Hollywood. Claro que, conhecendo-se Sirk e o seu sempre mencionado uso de espelhos e superfícies, o espectador sabe que o filme é muito mais do que isso. Aparentemente, é um filme para as donas de casa da classe média americana dos anos 50; aparentemente, é sobre os custos familiares e emocionais que uma mulher paga por optar por uma carreira, em vez de dar atenção à sua filha em crescimento e à sua própria vida sentimental; aparentemente, o centro do filme é ocupado por Lana Turner e Sandra Dee; aparentemente, o conflito entre a criada e a sua filha espelha o primeiro conflito. Claro que isto é apenas a superfície – palavra central, repetimos, quando se fala de Sirk. Somos levados a pensar que a história do filme é sobre a actriz em ascensão – e depois em pleno sucesso – interpretada por Turner. Esse centro seria, se assim fosse, um vazio completo. Lora Meredith é quase um arquétipo, é distante, sempre acompanhada por uma palete de azuis, de tons tão frios como a própria personagem. Como até o mais ingénuo iniciado no cinema do realizador sabe, o uso das cores é um dos aspectos centrais em Sirk; eles tornam explícito o tom emocional da personagem, os seus sentimentos reprimidos, o seu estado interior – não é preciso explicá-lo, o espectador sabe-o pelos jogos de luz e cores. Contraste-se os tons de Turner com as cores que rodeiam a criada Annie e a sua filha Sarah Jane, com os vermelhos, com as cores quentes. Estas são personagem que vivem, que vibram, que têm emoções reais e dolorosas, tão longe dos conflitos esquemáticos de Turner/Dee. Lora é o falso centro; se quiséssemos exagerar, diríamos que ela é o “macguffin”.
Os problemas de Annie e Sarah Jane não saem de um qualquer padrão pré-definido e estereotipado pelos dramas femininos, eles são demasiado reais. É este par de mãe e filha que preenche o aparente vazio emocional do filme e é com elas que Sirk subverte e supera as convenções do género, abrindo-as a um mundo muito mais complexo. Elas tornam-se, ainda que subtilmente, na verdadeira história, apesar de Sarah Jane ser, de alguma forma, um espelho de Lora. Annie é a criada negra de Lora, que esta vê como uma verdadeira amiga, já que juntas partem do nada e superaram todos os obstáculos. Sarah Jane é a jovem de pele clara, que vê a sua tonalidade como forma de ultrapassar os limites impostos pela sociedade, pois todos a vêem como branca – até descobrirem que a sua mãe é negra.
Sirk introduz através destas personagens o problema do racismo, de uma forma surpreendentemente intensa para um filme americano dos anos 50. O que o torna ainda mais intenso e insuportavelmente doloroso é a forma como este racismo aparece a dois níveis. O primeiro nível, o mais óbvio, através das provações de Sarah Jane, do seu inconformismo e desespero que a levam a renegar a sua mãe, como única forma de conseguir alguma coisa da sua vida – e, assim, sucumbindo ao aparente, à superfície, tão dolorosamente sublinhado no momento em que Annie põe a filha frente ao espelho, querendo que ela olhe para além do que vê nele. O segundo é mais escondido, mais insinuado. Lora, centrada em si e não vendo mais nada para além de si própria, é amiga de Annie. Não sabe, no entanto, nada sobre ela; o espectador pergunta até que ponto esta amizade é real, até que ponto não é apenas um reflexo dessa personalidade obcecada consigo mesma de Lora. Há aquela cena difícil e constrangedora em que Lora descobre que Annie tem amigos e vida para além daquela casa. Ela não sabia – “you never asked”, diz-lhe Annie. As duas amigas tinham partido juntas do nada – Lora triunfa e enriquece, Annie será sempre a criada.
Os filmes de Sirk não são realistas, há uma artificialidade assumida pelo realizador. Mas também não são apenas filmes manipuladores e decorativos para donas de casa. São abertamente sentimentais e melodramáticos, provocando um distanciamento e ao mesmo tempo um envolvimento (porque um exige o outro) no espectador. Aqui Sirk revela toda a sua influência brechtiana – ele encenou Brecht na Alemanha e foi muito influenciado pelo dramaturgo – de distanciamento e alienação, de teatralidade. Esta é uma das pontes de ligação com Fassbinder, para além da outra ainda mais óbvia – a força das personagens femininas. Foi, aliás, Fassbinder que sublinhou – e estou a parafrasear – como as mulheres de Sirk eram únicas no cinema americano de então, pois agiam e não se limitavam a reagir. Estas mulheres pensam e ultrapassam aquele estatuto tão típico de objecto decorativo. A tal ligação a Almodóvar e Haynes vê-se também aqui.
Quanto a este último, gostaria de deixar aqui uma nota ou duas. Todos sabem que Far From Heaven, de Haynes, referencia directamente um outro filme de Sirk, All That Heaven Allows. Até o casaco do jardineiro interpretado por Dennis Haysbert é igual ao que Rock Hudson usava no filme de Sirk. Haynes disse, na altura, que queria retomar os temas que estavam subentendidos nos filmes de Sirk e trazê-los à superfície, torná-los explícitos e abordá-los como uma audiência contemporânea esperava que fossem abordados. Referia-se, sobretudo, a dois temas – a homossexualidade e o racismo. De facto, o filme de Haynes lembra-nos por vezes Imitação de Vida, sobretudo naquela bondade e decência irrealista que Raymond Deagan partilha com Annie Johnson – o jardineiro e a criada negra são personagens que se sacrificam, como símbolo de tudo o que é verdadeiro num mundo de máscaras. O filme de Haynes também é um filme sobre a capacidade de ver para além da superfície – tal como o anterior, Velvet Goldmine, que ia buscar o mestre do disfarce e da máscara, Oscar Wilde, para falar sobre identidades e duplos.
Vejam Imitação de Vida. Nem que seja pela beleza das cores (tão belas quanto estas, só as de Imperatriz Yang Kwei-Fei de Mizoguchi) ou pela cena final com a enorme e fabulosa Mahalia Jackson, verdadeira rainha do gospel. Dia 13 de Dezembro, no cinema.

Maria Braun

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Assim começa a temporada



Inicia-se a temporada de prémios de cinema nos Estados Unidos com o anúncio do National Board of Review. No Country for Old Men, dos irmãos Coen, confirma o favoritismo que já há algum tempo lhe tem sido apontado e é considerado o melhor filme do ano. Na lista dos 10 melhores estão ainda, por ordem alfabética, The Assassination Of Jesse James By The Coward Robert Ford, Atonement, The Bourne Ultimatum, The Bucket List, Into The Wild, Juno, The Kite Runner, Lars And The Real Girl, Michael Clayton e Sweeney Todd. O prémio de melhor realizador foi para Tim Burton (Sweeney Todd), o de melhor actor para George Clooney (Michael Clayton) e o de melhor actriz para Julie Christie (Away From Her, que foi lançado em Portugal directamente em DVD, não se percebe bem porquê). O Escafandro e a Borboleta, injustamente insultado pela crítica portuguesa, ganhou melhor filme estrangeiro. Os secundários foram para Casey Affleck (Jesse James) e Amy Ryan (Gone Baby Gone). Os irmãos Affleck parecem estar em maré de sorte, já que, para além de Casey, também Ben ganhou um prémio, o de estreia em realização por Gone Baby Gone.
São indicadores para os Óscares do próximo ano, mas apenas isso. No ano passado, por exemplo, Mirren e Whitaker venceram nas categorias de interpretação, mas o melhor filme foi para Cartas de Iwo Jima; há dois anos, o vencedor foi Good Night, and Good Luck.
Vamos começar a fazer apostas?

Maria Braun

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Rufus! Does Judy!


Rufus Wainwright no London Palladium

São hoje lançados o CD e o DVD com o tributo de Rufus Wainwright a Judy Garland, a recriação do mítico concerto de 1961 no Carnegie Hall. O CD foi gravado nessa mesma sala nova-iorquina, o DVD no London Palladium. Fica um aperitivo.

Maria Braun